domingo, 26 de setembro de 2010
Ode a um Rouxinol
(1819)
"Meu coração sofre uma dor misteriosa
Como se eu bebera cicuta,
Ou ópio evanescente;
O minuto passado já naufragou no esquecimento.
Não invejo tua vida feliz,
Pois me sinto feliz em tua felicidade,
Onde Dríades aladas e luminosas pairam sobre as árvores
Nalguma melodiosa planície
De sombras e áreas verdes infinitas,
Tocada de leve pelo mormaço do verão.
Oh, a brisa sobre os vinhedos!
Refresca há muito tempo as profundezas da terra,
Saboreando a flora dos campos verdejantes,
Baila ao som de uma canção provençal e cora de alegria!
Oh, uma taça repleta do calor do Sul,
Transbordante do verdadeiro rubor do Hipocrene,
Borbulhando de espumas até a borda
E tingindo de púrpura os lábios que a tocam;
Aquela taça eu sorveria e o mundo se tornaria invisível,
E contigo eu desapareceria numa remota floresta.
Sumir para bem distante, até esquecer completamente,
Contigo no meio da folhagem,
O cansaço, a angústia e a aflição.
Aqui, onde os homens sentam e escutam, uns dos outros, os gemidos;
Onde a agitação e a tristeza sossegam um pouco,
Onde a juventude cresce firme e os fantasmas morrem;
Onde pensar é estar a salvo do sofrimento
E o plúmbeo olhar desaparece,
Onde a beleza não pode ocultar o teu olhar brilhante,
Nem um novo amor ansiar por algo além do amanhã.
Longe, muito longe, eu voarei contigo,
Nunca na carroça de Baco puxada por seus leopardos,
Mas nas asas invisíveis da Poesia.
Contudo, o pensamento se assusta e se atrasa:
Já contigo! Suave é a noite,
E por acaso a rainha lua encontra-se no seu trono,
Cercada por sua corte de estrelas;
Mas aqui não há luz
Exceto a que vem do céu com o sopro da brisa
Através da umbrosa verdura e de caminhos serpenteantes e relvosos.
Não posso ver as flores aos meus pés
Nem sentir o oloroso incenso que paira sobre a ramagem,
Mas inebriado, na penumbra, acho tudo doce.
Graças à oportuna primavera,
Contemplo a relva, o bosque e as árvores frutíferas;
Claros espinhos e madressilvas silvestres.
Fugazes violetas deitam-se sobre as folhas;
E destacam seu mais antigo broto;
Surge uma rosa amarela cheia de orvalho
A sussurrar sua habitual canção do entardecer.
Secretamente escuto, e muito tempo
Fico quase fascinado pela leveza da morte,
Chamei-a por palavras ternas em várias rimas,
Para se mesclar ao ar da minha calma respiração;
Agora, mais do que nunca, parece doce morrer
Para tudo acabar à meia noite, sem nenhuma dor,
Enquanto tua arte flui, tua alma te abandona
Num êxtase absoluto!
E ainda tu cantarias e eu escutaria em vão -
A fim de que teu réquiem se tornasse um adeus.
Tu não nasceste para morrer, pássaro imortal!
Nem a fome dos homens ousou te abater;
A voz que a noite passada eu escutei
Também foi ouvida pelos palhaços e imperadores de outrora;
Talvez a tua própria canção haja encontrado um caminho
Através do triste coração de Ruth, quando doente em sua casa,
Ela chorou lágrimas nutritivas que te alimentaram;
As mesmas que tiveste, muitas vezes
Nos mágicos beirais;
Nas espumas das vagas
De perigosos mares, ou na terra encantada do desespero.
Desespero! Esta palavra é como um sino
Cujo dobre traz-me de volta o meu passado!
Adeus! A ilusão não pode enganar para sempre.
Adeus! Adeus! Teu lamentoso canto silencia,
Ainda há pouco se ouvia perto das campinas, sobre o regato,
Nas encostas da montanha; mas agora está sepultado profundamente
Numa clareira de um vale próximo.
Teria sido uma alucinação ou um sonho velado?
Acabou aquela música: - Estou desperto ou durmo."
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário